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Pavillion/ Cristiano Lenhard e o habitante do plano de fora

Cristiano Lenhardt, artista visual gaúcho (Itaara, 1975), encerrou há pouco na capital paulista a exposição individual “O habitante do plano para fora” com esculturas, desenhos e instalações de iluminação e de som com gravações próprias. Produzidas com diferentes materiais e com propostas estéticas específicas, tais obras logravam um poético diálogo entre si ao recriarem uma atmosfera lúdica, circense e de contrastes entre planos no amplo ambiente do galpão onde foram instaladas. O artista, que vive e trabalha no Recife (PE), teve como inspiração suas observações sobre as ruas recifenses, as manifestações folclóricas locais, o comércio ambulante e seu próprio dia a dia.

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Assim como em obras anteriores, Lenhardt utilizou para a ocasião objetos cotidianos para desconstruir suas funções ordinárias, oferecendo-lhes um novo significado estético e, consequentemente, uma nova função em seu mundo. Essa proposta desestabilizadora do ordinário verificava-se também com a série de esculturas modulares Pau-Bonito, as quais eram formadas pela junção de módulos de madeira esculpidos e pintados com cores tipicamente circenses: branco, vermelho e azul. Aqui, um observador mais atento percebia que ditos módulos eram, na verdade, uma composição única de pés de camas, armários e mesas – no melhor estilo da tradição nordestina do entalhe em madeira e na qual o artista buscou sua inspiração. Sustentados verticalmente por cordas tensionadas e presas ao chão, esses módulos alegremente coloridos dispunham-se esparsamente no ambiente como tendas de circos e convidavam o visitante a penetrar em suas áreas vazadas e labirínticas num espaço bi e tridimensional. Deixando de ser meros objetos de sustento de móveis e, assim quase imperceptíveis à visão cotidiana, esses módulos transformavam-se em elementos protagonistas capazes de nos transportar ao plano de fora ou, ao menos, ao plano da nostalgia do mundo infantil que pode nos remeter a ideia de circo dessas instalações. Simultaneamente, esses objetos escultóricos tinham o caráter de evocar também manifestações folclóricas da região onde reside o artista: lanças de caboclos, paus-de-fita, estandartes. Lenhadt defende que a série Pau-Bonito tinha a função de configurar áreas estéticas em relação às outras obras da exposição, pois elas demarcavam o espaço onde atuavam seus outros trabalhos como, por exemplo, os trabalhos Cara Preta.

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Aqui, folhas de papel alumínio pretas suspensas no ar por bastidores de madeira receberam tênues perfurações, que não chegavam a vazar, compondo desenhos de máscaras tribais e, novamente, evocando a cultura da conhecida canção popular infantil. Se com essas caras o visitante não lograva traspassar o plano para fora das obras, na série Perfurações conseguia em partes. Aqui, grandes folhas de papel foram meticulosa e matematicamente quadriculadas pelo artista em um trabalho exaustivo que convergia nas finas perfurações que compunham delicadas formas geométricas, percebidas somente à distância. Essa intervenção do artista sobre o papel vazado demonstra seu gesto de querer nos revelar o que estaria por detrás do plano observado e, assim, nos levar a um outro espaço estético até então desconhecido ou a um espaço somente por ele conhecido. Porém, a pequenez dessas perfurações impossibilitava nossa passagem completa para o além. Sendo que, desde o aquém, o observador era levado do micro ao macrocosmo, onde grandes desenhos geométricos eram construídos a partir de ínfimos movimentos vazantes e, assim, dando ao desenho um tratamento escultórico.

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Com essas obras, Lenhardt compôs num grande galpão um espaço lúdico que permitia ao visitante jogar com diferentes planos e movimentos de dentro para fora, e vice-versa. Esse jogo visual culminava com a instalação Linha de laser: uma projeção de formas coloridas de luz sobre a parede e que podia ser interpretada como uma outra referência à cultura popular da região onde mora, agora ao gênero musical popular do forró tecno brega. Se nessa instalação há a ausência de som, na Banda sonora do vídeo Meu Mundo Jegue o artista preenchia o espaço com uma narrativa não-linear e nonsense que necessitava a intervenção do visitante para fazer tocar o vinil ali instalado. Com isso, uma vez mais Cristiano Lenhardt desestabilizava o visitante de seu plano ordinário ao conduzi-lo ao plano de fora de sua zona de conforto, ao plano do inesperadamente simples, novo e nosso entalhado por ele.

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Observações:

  • Este texto foi originalmente publicado no blog da revista eletrônica www.peixe-eletrico.com no dia 3 de agosto de 2015.

  • Todas as fotos expostas no texto foram gentilmente cedidas pela assessoria de imprensa da Galeria Fortes Vilaça.

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